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quinta-feira, 21 de maio de 2009

Os Cativos

Encostados ás grades da prisão,
Olham o céu os pálidos cativos.
Já com raios oblíquos, fugitivos,
Despede o sol um ultimo clarão.

Entre sombras, no longe, vagamente,
Morrem as vozes na extensão saudosa.
Cai do espaço, pesada, silenciosa,
A tristeza das cousas, lentamente.

E os cativos suspiram. Bandos de aves
Passam velozes, passam apressados,
Como absortos em íntimos cuidados,
Como absortos em pensamentos graves.

E dizem os cativos: Na amplidão
Jamais se extingue a eterna claridade...
A ave tem o voo e a liberdade...
O homem tem os muros da prisão!

Aonde ides? qual é vossa jornada?
À luz? à aurora? à imensidade? aonde?
Porém o bando passa e mal responde:
À noite, à escuridão, ao abismo, ao nada!

E os cativos suspiram. Surge o vento,
Surge e perpassa esquivo e inquieto,
Como quem traz algum pesar secreto,
Como quem sofre e cala algum tormento.

E dizem os cativos: Que tristezas,
Que segredos antigos, que desditas,
Caminheiro de estradas infinitas,
Te levam a gemer pelas devesas?

Tu que procuras? que visão sagrada
Te acena da solidão onde se esconde?
Porém o vento passa e só responde:
A noite, a escuridão, o abismo, o nada!

E os cativos suspiram novamente.
Como antigos pesares mal extintos,
Como vagos desejos indistintos,
Surgem do escuro os astros, lentamente.

E fitam-se, em silencio indecifrável,
Contemplam-se de longe, misteriosos,
Como quem tem segredos dolorosos,
Como quem ama e vive inconsolável...

E dizem os cativos: Que problemas
Eternos, primitivos vos atraem?
Que luz fitais no centro d'onde saem
A flux, em jorro, as intuições supremas?

Por que esperais? n'essa amplidão sagrada
Que soluções esplêndidas se escondem?
Porém os astros tristes só respondem:
A noite, a escuridão, o abismo, o nada!

Assim a noite passa. Rumorosos
Sussurram os pinhais meditativos,
Encostados ás grades, os cativos
Olham o céu e choram silenciosos.


Antero de Quental (Os Sonetos Completos, 1886)

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